A ilegalidade dos jogos de azar no Brasil e a responsabilidade jurídica de seus propagadores

Por Lucile Kirsten.

No Brasil, os jogos de azar são considerados ilegais pela legislação em vigor, estabelecida principalmente pela Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/41). Essa legislação proíbe a exploração e a prática de jogos de azar em território nacional, exceto por algumas exceções pontuais, como as loterias federais e os jogos autorizados em cassinos específicos de regiões determinadas pelo governo.

De acordo com o Artigo 50 da Lei nº 3688/41, § 3º, consideram-se “jogos de azar” atividades nas quais o ganho e a perda dependem exclusivamente ou principalmente da sorte, incluindo apostas sobre corridas de cavalos fora de hipódromos ou locais autorizados, bem como apostas em outras competições esportivas. Veja-se:

§ 3º Consideram-se, jogos de azar: a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte; b) as apostas sobre corrida de cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas; c) as apostas sobre qualquer outra competição esportiva.

Essa proibição visa controlar os impactos negativos associados aos jogos de azar, tais como o vício em jogos, lavagem de dinheiro e outros crimes financeiros. Apesar das regulamentações, é comum encontrar propagandas e divulgações desses jogos em diversas mídias, especialmente nas redes sociais, muitas vezes promovidas por influenciadores digitais.

Alguns desses influenciadores desempenham um papel significativo na disseminação de conteúdo na internet, possuindo uma base considerável de seguidores. Ao promoverem jogos de azar, esses influenciadores podem estar infringindo a lei e, portanto, sujeitos a responsabilidade jurídica.

Um exemplo concreto dessa problemática pode ser encontrado no Artigo 174 do Código Penal brasileiro. Leia-se:

Art. 174 – Abusar, em proveito próprio ou alheio, da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade mental de outrem, induzindo-o à prática de jogo ou aposta, ou à especulação com títulos ou mercadorias, sabendo ou devendo saber que a operação é ruinosa: Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.

Na prática, é comum encontrar nas redes sociais anúncios que não incluem advertências claras sobre os diversos riscos envolvidos na prática de apostas. Ao invés disso, são utilizadas chamadas sensacionalistas como “Fique rico rápido” ou “Ganhe milhares de reais por mês sem esforço”, explorando assim a ingenuidade dos usuários e os levando a situações financeiras desfavoráveis.

Em termos legais, a responsabilidade dos influenciadores digitais 

pela divulgação de jogos de azar pode ser enquadrada de diversas formas, dependendo do contexto e da legislação específica. Dentre as possibilidades de condenação, podemos citar:

1. Condenação Criminal: Por instigar a prática de apostas ilegais, conforme determina o Código Penal, mencionado anteriormente.

2. Violação da Lei das Contravenções Penais: A promoção de jogos de azar pode configurar contravenção penal conforme estabelecido pelo Decreto-Lei nº 3.688/41, sujeitando o influenciador a penalidades legais.

3. Publicidade Irregular: Caso a divulgação de jogos de azar seja considerada publicidade irregular, o influenciador pode ser responsabilizado conforme o Código de Defesa do Consumidor e outras legislações pertinentes à publicidade.

4. Responsabilidade Civil: Se a promoção dos jogos de azar resultar em danos a terceiros, como vício em jogos ou prejuízos financeiros, o influenciador pode ser responsabilizado civilmente e ser obrigado a indenizar os prejudicados.

5. Sanções Administrativas: Órgãos reguladores, como o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), podem aplicar sanções administrativas aos influenciadores que violarem as regras de publicidade e promoção de jogos de azar.

Atualmente, tramita o Projeto de Lei nº 3915/2023, que busca justamente proibir a divulgação desses jogos de azar por influenciadores digitais. Essa proposta visa reforçar as regulamentações existentes e coibir a disseminação irresponsável de conteúdo relacionado a jogos de azar nas redes sociais e outras plataformas online.

Além disso, vale ressaltar que a proibição desses jogos também pode gerar consequências para os próprios jogadores, sendo possível inclusive aplicação de multas, apesar de muitos não saberem dessa informação e manterem a prática de apostas ilegais sem nem imaginar que estão cometendo uma contravenção. É o que diz o §2º do Artigo 50 da Lei nº 3688/41, ipsis litteris:

Art. 50. Estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele. Pena – prisão simples, de três meses a um ano, e multa, de dois a quinze contos de réis, estendendo-se os efeitos da condenação à perda dos moveis e objetos de decoração do local.

§ 1º A pena é aumentada de um terço, se existe entre os empregados ou participa do jogo pessoa menor de dezoito anos.

§ 2º  Incorre na pena de multa, de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), quem é encontrado a participar do jogo, ainda que pela internet ou por qualquer outro meio de comunicação, como ponteiro ou apostador.      

Diante o exposto, tanto as empresas que operam aplicativos de apostas quanto os influenciadores e usuários desses aplicativos devem prestar atenção à legislação vigente para evitar a prática de crimes. É essencial compreender as leis e regulamentações relacionadas aos jogos de azar e buscar o auxílio de advogados especializados para garantir conformidade com a legislação aplicável, evitando consequências legais indesejadas e promovendo uma conduta ética e legalmente responsável em relação às apostas e jogos de azar.

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