É possível cumprir pena estrangeira no Brasil ? – Análise do caso Robinho.

Por Eduarda Sprea Ciscato.

Muito tem-se discutido acerca do caso do jogador de futebol brasileiro, Robinho, que fora condenado na Itália pelo crime de estupro. Quando um estrangeiro é condenado fora do seu país nativo, a autoridade central aciona o país de origem e solicita a extradição ou, quando não for possível extraditar e houver previsão legal, a transferência da pena. Mas como funciona esse processo ?

I. EXTRADIÇÃO.

Extradição executória é o processo pelo qual uma pessoa condenada por um crime em um país é entregue às autoridades desse mesmo país para cumprimento da pena imposta. Trata-se de forma de cooperação internacional entre países na luta contra o crime transnacional e a busca por maior efetivação da justiça.

No Brasil, não é possível extraditar brasileiro nato, conforme prevê o artigo 5, inciso LI, da Constituição Federal. Assim, o brasileiro nato que cometa um crime no exterior e retorne ao Brasil, não poderá ser extraditado ao país local de cometimento desse delito. A impossibilidade de extradição de nacionais parte da ideia de que o papel do estado é de protejer os seus súditos. Tal ponto foi fundamental para implementar o conceito de “homologação de sentença estrangeira para fins de transferência de pena”.
Mas afinal, se o brasileiro nato não pode ser extraditado, como funciona a homologação da sentença estrangeira?

II. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA NO BRASIL

No Brasil, a decisão de homologação de sentença estrangeira tem que ser tomara pelo STJ, que decidirá que estão presentes os requisitos legais para que a sentença possa ter efeitos no Brasil. O fato do réu de ser culpado ou inocente não estará em pauta de discussão pela Corte Especial, vez que a homologação não prevê a possibilidade de rever o mérito da causa. Em relação aos requisitos para homologação da sentença exigidos pelo artigo 963 do CPC, a Corte Especial destacou que houve trânsito em julgado da decisão italiana, e que Robinho foi representado por advogado e pôde se defender durante todas as fases do processo. Além disso, apontou que os mesmos fatos que levaram à condenação do atleta também constituem crime no Brasil. 

III. HISTÓRICO DA DISCUSSÃO DE HOMOLOGAÇÃO DE PENA EXTERIOR
A homologação de pena estrangeira não é comum no país. Isso pois, até 2017 não havia tal previsão. Essa possibilidade foi incluída no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei de Migração (Lei 13.445/2017), que possibilitou que o brasileiro nato condenado no exterior cumpra a pena em território nacional. Antes disso, havia a previsão de homologação de sentença apenas para fim civil ou cumprimento de medida de segurança. Além disso, o mais comum é o estrangeiro ficar no país em que comentou o crime, como exemplos, o caso do Daniel Alves, assim, não há necessidade de homologação, vez que, se condenado, cumprirá a pena no próprio local de cometimento do delito.

IV. RETROATIVIDADE DA LEI DE 2017

Na data em que o crime foi supostamente cometido por Robinho (2013), não havia nenhum dispositivo legal em vigor a autorizar a homologação de sentença condenatória estrangeira pelo Judiciário brasileiro. Com efeito, o CP, no seu artigo 9º, I e II, somente autorizava, e ainda autoriza, a homologação de sentença estrangeira em duas hipóteses: “obrigar o condenado à reparação do dano, a restituição e a outros efeitos civis; e sujeitá-lo à medida de segurança”.

Ocorre que, em novembro de 2017, entrou em vigor a Lei de Migração (Lei 13.445/17), a qual, em seus artigos 100 a 102, introduziu novos casos de homologação de sentença estrangeira, permitindo agora, a autorização de cumprimento em solo brasileiro, também da condenação a pena de prisão. Deste modo, a partir do início de sua vigência, duas questões com repercussão no caso Robinho surgiram: (a) os artigos 100 a 102 da Lei de Migração se aplicam a brasileiro nato? (b) esses dispositivos podem retroagir para alcançar crimes cometidos antes de sua entrada em vigor?

Como regra, no Brasil, leis materialmente penais, com caráter punitivo, não retroagem, ante a regência do princípio da irretroatividade in pejus. Nesse sentido, tem natureza penal toda e qualquer norma que crie, extinga, aumente ou reduza a intensidade do direito de punir.

No caso de Robinho, tem-se que a Lei de Migração, que estabeleceu a possibilidade de homologação de sentença estrangeira de pena, é de 2017, e o crime por ele cometido na Itália, foi em 2013. Ou seja, crime anterior a Lei de Migração. Portando, um forte ponto de discussão no julgamento do STJ, foi se a Lei de Migração é materialmente penal, e, nesse caso não poderia retroagir e atingir o crime cometido.

V. DECISÃO DO STJ – CASO DO ROBINHO.

Entendeu o STJ que normas sobre cooperação internacional não têm natureza criminal e, portanto, possuem aplicação imediata, não incidindo sobre elas o princípio da irretroatividade da lei penal. Assim, o posicionamento do STJ foi no sentido de homologar a sentença italiana e condenar Robinho pelo crime de estupro, com início imediato ao cumprimento da sentença.

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